terça-feira, 17 de maio de 2011

"Sabedoria e Filosofia" - Pinharanda Gomes



«A noção de filosofia é pitagórica. O pós-pitagorismo eleva aquela noção matinal, e ainda obscura, à categoria fundamental de ideia e, logo, de sistema, no trânsito gnoseológico que vai de Sócrates ao ciclo aristotélico. Antes da conceptual ironia, ou modéstia, inteligida na filosofia pela escola pitagórica, o que os gregos conheciam era a sophia, a sabedoria. Antepondo o prefixo cinemático do amor ao substantivo, Pitágoras bipolarizava a enteléquia sapiencial em duas metades convergentes: o que é sabedoria, e o que ama a sabedoria. A noção pitagórica define um extremo universal puro, a transcendência, e um extremo singular em ascensão, a imanência. Coloca a sabedoria no céu divino, e o amor como necessidade dela, na terra humana. Como a sabedoria do céu divino é o distante por excelência, e a necessidade da terra humana é o próximo sem dúvida, a inteligência pitagórica como que obriga a descer da vaidade da posse do saber todo, para a realidade do domínio de apenas algum saber. Deste modo, sem negar as vias de acesso ao superno, Pitágoras põe a tónica na imediateidade; adianta, por isso, uma nova visão dos limites humanos. Enquanto a sabedoria é atributo divino, a filosofia é predicado humano. De uma à outra, vai a distância vertical da terra ao céu.»

Pinharanda Gomes
in "A Filosofia Hebraico-Portuguesa"

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